sexta-feira, 29 de junho de 2007

Lágrimas de um columbófilo

 
Tem setenta e alguns anos. Não sei ao certo.
Fui visitá-lo recentemente e como tantas outras vezes, dei com ele sentado no pombal, imóvel, pensativo e com um ar triste.
A campanha tinha acabado. Estava agora na companhia dos seus amigos pombos, a fazer o balanço da última época desportiva.
Notei-lhe uma pequena lágrima ao canto do olho.
Hesitei se havia de me afastar ou manter-me ali. Senti que estava a ser um intruso num pequeno mundo que não era, naquele momento, o meu.
Viu-me e já não me deixou sair.
Levou a mão ao bolso e com o lenço limpou a lágrima que já lhe escorria pela cara abaixo.
Pensei em nada dizer mas a amizade que nos une, obrigou-me a querer saber a causa daquela tristeza. Levou algum tempo e começou a falar...
Disse-me que estava a agradecer aos pombos os momentos felizes que, ao longo de uma vida, lhe tinham proporcionado.
Entretanto, de repente, tinha-se lembrado do Pombo Azul, do Vermelho, do Pena Branca, do cigano, do setenta e oito e de tantos outros aos quais não podia agradecer por não estarem ali. Onde estariam, não sabia. Algures por esse país fora ou em Espanha, presos onde quer que tenham entrado para mitigar a sede e de onde nunca mais os deixaram sair. Outros mortos...talvez.
A culpa não era deles. A culpa era dos homens que não lhes proporcionaram as devidas condições para regressarem e agora, quanto mais não fosse, nem para lhes agradecer os bons momentos que lhe fez passar, o podia fazer.
Levantou-se do pequeno banco onde estava sentado, respirou fundo e com um esforço, voltou a sorrir.
Nos cacifos do seu pequeno pombal, voltava a haver vida. Novos borrachos já se movimentavam e com eles o renascer de esperanças futuras.
Desejou que ao menos aqueles viessem a ter melhor sorte do que os da época anterior e que os homens de quem eles dependem, especialmente dirigentes, deixassem de ser tão maus.
Mário Carlos Areosa